quinta-feira, 4 de abril de 2019

Poemas de boteco e um tiro no escuro

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- Nossa, meu bem, que boteco mais brega!
- Ah, querida, é meu bar preferido. Sento naquele balcão todas as noites na esperança de ter alguma inspiração concreta para escrever meus poemas.
- Mas, meu bem, cerveja barata, comida mais barata ainda. Gente bizarra. Bêbados pedindo esmolas para comprar mais bebidas. Um som um tanto quanto chato e iguais uns aos outros. Blues? Jazz? Que merda de lugar é este que você me trouxe?
- É o meu lugar preferido. Quando machucares o meu coração e me largares de vez, será aqui onde qualquer ser humano irá me encontrar.
- Como tens tanta certeza de que irei te machucar?
- Você não gostou do meu lugar preferido. Já é um acerto para minha solidão.
- Meu bem, olha este lugar. Banheiros imundos. Garçom arrogante. Pessoas solitárias e cabisbaixas sentadas no balcão apenas olhando para o nada ou escrevendo cartas e pedindo mais e mais bebidas. Um velho grisalho segurando um violão olhando para o nada esperando alguém nota-lo para que toque alguma música significativa. Meu bem, isso não é um lugar agradável.
- Mas isso é um lugar de verdade. Da verdade. A minha verdade. Vê todas essas pessoas solitárias e cabisbaixas? Eu sempre fui uma delas até o momento em que te trouxe aqui. Vê esses banheiros imundos? É meu coração, tão sujo quanto todos os romances que fui capaz de me entregar. Vê todas essas bebidas? São bebidas baratas que fizeram eu me entregar a elas por causa de amores baratos que nada tinha para me dar. E essas cartas que eles escrevem? Eles só não entregam ao mundo como eu sou capaz de entregar. Essa é a diferença. E aquele velho grisalho com o violão, querida, querendo algum tipo de atenção, sou eu na espera inconstante e desesperançosa de algum amor que me dê algum tipo de atenção verdadeira que me faça sair de lugares como esse. Até então, meu bem, esta é minha segunda casa.
- É tudo tão brega, meu bem. Tão brega!

Eu escrevo sim algumas cartas de amor. Me embebedo quase todas as noites com o pensamento de que o amor é algo inaceitável para esse coração que amou demais. E eu espero demais. E eu penso demais. E eu sonho demais. Olho para as frestas de minhas janelas na esperança de que algum ar de esperança entre por elas e me tire de minha cama. Escrevo cartas de amor e depressão na esperança de que eu seja salvo por uma mão que me puxe para um labirinto melhor do que este em que estou batendo de frente todos os dias de minha vida. E eu escrevo. Escrevo demais. E penso demais. E choro demais. Sozinho. Em silêncio, mas choro. E nada mais parece me agradar. Nada mais parece me abalar. Nada mais parece intervir num peito que está blindado o suficiente para não cair em tentações de amores como os que eu tive no passado. E isso é errado. Muito errado. E prejudicial. E eu gostaria de me entregar, verdadeiramente, para alguém de novo. Gostaria de beber menos. Largar as escrituras. Não ter que escrever mais. Não da forma que insisto em escrever. Não dessa forma. Mas gostaria de entregar cartas de amor apenas para a pessoa que meu peito é capaz de pulsar. E meu amor foi embora faz um tempo. E eu procuro. Entro em baús dentro de meu próprio coração tentando alcançar algo que me satisfaça novamente e faça ele bater forte como um dia bateu. Que procura desprezivelmente triste esta a minha. Eu gostaria de não ser tão brega. Não sentir tanto. Não querer tanto. Não me importar tanto. Gostaria de ser como muitos caras que apenas sentem o prazer momentâneo de sentimentos vazios que o mundo está tão, mas tão cheio de sentir. Pessoas rasas. Sentimentos curtos. Romances mais curtos ainda. Nada que dure uma noite ou apenas algumas horas. Não. Não, caralho!!! Eu não quero isso. Eu nunca fui disso. Se for para ter romances e amores e sentimentos, que sejam de verdade, senão eu nem faço questão nenhuma de me entregar.
Assuma o controle, querido. Assuma o controle, meu bem. Amores voltam. Amores são sentido cada vez mais forte dentro de qualquer peito entristecido pelo tempo.
MENTIRA, PORRA!!!

- Meu filho, você não têm estado bem esses dias, não é mesmo?
- Está tudo bem. Tudo em seu lugar. Tudo como deveria estar.
- Estou te sentindo tão, mas tão distante. Você está quieto. Para baixo. Não coloca mais cores a esta casa. Mal te vejo por aqui.
- Está tudo bem. Tudo onde deveria estar. Meu trabalho, meus amigos, minhas contas. Tudo que chamo de vida esta onde deveria realmente estar.
- Mas, e o teu coração, onde ele está?

Camisetas velhas e surradas. Poemas longos. Cartas de despedidas. Pensamentos absurdos. Cigarros. Cervejas. Poemas. Mais poemas. Cachorro de estimação com um olhar triste ao me ver, entendendo que existe algo de errado. Cama vazia e bagunçada, como minha vida, como minha mente, como meu peito. Músicas tristes jogadas ao vento. Mais e mais poemas. O amor bateu em minha porta mais uma vez. Eu sabia que era ele. Não atendi. Deixei bater, me fingi de morto. Fingi que a casa estava vazia. De alguma forma ele sabia que não estava. Bateu novamente. TOC TOC TOC. Respirei fundo. Continuei fingido que ninguém se encontrava na residência. Meu coração disparou. Pensei em todos os romances que fui capaz de sobreviver. PLOW PLOW PLOW. O amor bateu mais forte em minha porta. Gritou. Gritou alto. Tão alto que o bairro todo soube que existia alguma coisa de errados aos arredores. E eu me curvei em minha cama. Coloquei a cabeça dentro das cobertas. Não abri. NÃO ABRI, PORRA. Implorei para ele ir embora. Não, ele não foi. Tudo em silêncio. Silêncio perturbador. Ouvia tua respiração. Segurei o fôlego. Me mantive onde precisava me manter. VÁ EMBORA, VÁ EMBORA, eu pensava. TOC TOC TOC. Bateu em minha porta mais uma vez. Não disse nada. Absolutamente nada. Alguns minutos se passaram. Me mantive onde era para eu me manter. Não, ele não pode entrar. Não, caralho, não posso cair nessa de novo. Não. Ninguém está disposto, verdadeiramente, a me amar como eu deveria ser amado. Ninguém tem coragem. Nem eu mesmo tenho coragem de me amar. Amedrontado, me mantive intacto no meu lugar. PLOW PLOW PLOW PLOW PLOW, pancadas mais fortes e maiores. MEU DEUS, manda esse amor embora, por favor. POR FAVOR, EU IMPLORO!
O coração gritando em silêncio "AGUENTA, AGUENTA, NÃO SAIA DAI". Cadê o meu amor? Essa porra existe? Caralho, vá embora. Vá embora! Não te fiz nada.
Ouvi uma risada longa e perturbadora. "Eu sei que estas ai. Eu sei", disse a voz do outro lado da porta, calma e paciente. "Uma hora terás que abrir", ela completou.
O amor é uma morte cruel que insiste em bater em minha porta. Mas não, não, não, não, ela não quer me matar. Ela quer um pouco de tortura psicológica para ela conseguir dar alguns bons e velhos surtos de risos e sorrisos e deboches.

- Meu bem, porque insistes em vir nesse bar?
- Porque insistes em me amar, querida?
- Mas...meu bem...eu não te amo. Não como deveria!

"Conversa com a mãe se não estiver bem, ok, meu filho? Não faz bobagem sozinho no seu quarto de novo não. A mãe não aguentaria!"

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