segunda-feira, 19 de outubro de 2020

Querida, cartas românticas são tão démodé. E eu odeio isso PRA CARALHO!

E ainda sim, te escrevi uma carta romântica. 
Sabendo de todo o clichê.
E não me importando com as mentiras verdadeiras que meu coração me conta.
Eu quero te pedir para entrar.
Te pedir para ficar.
E dizer para que não se vá.
Eu quero tuas mãos entrelaçadas as minhas.
Quero sentir a imensidão desse ato.
Pretendo sentir o teu carinho em minha barba.
E o teu cheiro em meus lençóis.
Quero dividir nossas cervejas.
Compartilhar nossos tragos.
E te entregar as melhores poesias.
Mesmo sabendo que nada disso é verdade.
Mesmo sabendo que um dia tu irá sair por aquela porta e fingir que não me conhece.
Não mais.
Em algum momento, tu olharás para trás e me dirá adeus.
Mas não quero pensar isso agora.
Mesmo sabendo que o fim sempre está mais próximo do que a gente pensa.
Quero ler todas as minhas poesias pertinho de tua orelha.
E te ouvir suspirar com tua voz cansada que eu sou a pessoa certa da tua vida.
Mesmo cheio de falhas.
Mesmo cheio de defeitos.
Mesmo cheio de problemas.
Quero esvaziar a minha mente ao teu lado.
Sorrir o teu choro.
Engolir teus dias ruins.
E abraçar teu corpo cansado e suado enquanto me fala das tuas decepções.
Quero escrever a tua mente com meu sorriso.
Quero entrelaçar nossos braços nos dias chuvosos.
E sentir a tua nuca arrepiada ao sentir meu beijo descendo por ela.
Quero sentir o prazer de tua alma enquanto goza comigo.
Quero te beijar e esquecer do mundo lá fora.
Esquecer dos meus problemas. Dos teus. Dos nossos.
Vamos gozar.
Entre.
Fica.
Eu abro a porta para que entre em minha vida.
E te peço para não ir embora.
Não enquanto o meu sorriso for o teu motivo.
Não se vá.
Não como todas as pessoas se vão.
E tudo se transforma em atos em vão.
Se for para tu ir, que seja para comprar mais cervejas, enquanto eu peço o jantar.
Pode ser o contrário também.
Me faça acreditar que o amor ainda existe.
Me deixa acreditar que eu posso sorrir quando eu já não me sinto capaz disso.
Não cobra nada de mim, a não ser carinho.
E que eu cobre de você apenas sorrisos.
Deixa eu te entregar uma poesia clichê como essa.
Deixa eu jogar palavras ao vento e vê-las voando para a imensidão de nosso mundo.
Eu quero que essa carta se perca no oceano e chegue até você.
De algum jeito.
De alguma forma.
Seja lá como for.
E eu quero saber que leu e sorriu.
Quero saber que pensou na gente.
E continuou sorrindo.
Quero pensar que o teu dia ruim se tornou em um dia maravilhoso depois de ler cada palavra.
Que teu choro engasgado pelos planos ruins do mundo se tornem sorrisos alegres depois de tanto clichê.
O romance pode até ser démodé. 
Mas o sentimento está ali fora.
E eu ainda sei sorrir.

- Meu bem. Meu bem. Você não para de beber, não é mesmo?
- Bêbado por causa da saudade.
- Ainda não superou essa merda de amor.
- Ainda não descobri outras formas de amar. Deve ser essa a minha saudade.
- Meu bem. Meu bem. Essa porcaria de amor é tão clichê. A gente sempre se apaixona por tolos e nos sentimos tolos e ficamos tolos. E bobos. E burros. E tudo termina sempre da mesma forma. Com choros. Tristezas. Angústias e uma faca e nossos próprios pescoços. Não deixa isso te devorar, querido.
- A cerveja amarga o amargo do amor. E eu já nem ligo mais. Isso me devorou já faz um tempo.
- Você ainda vai amar de novo. Se é que já não estas amando e nem sabe.
- Tu sempre está certa, querida. Tu sempre acerta.

A minha barba está sempre bagunçada.
A minha cama também.
Pelos cantos do quarto existem garrafas e latas de cerveja vazias.
E cartas e poemas nas lixeiras.
Várias delas.
Eu sorrio sozinho enquanto a água do chuveiro cai sob minha cara.
Eu falo comigo mesmo quando penso em te falar algo.
E penso muito alto quando quero te pedir para entrar em minha vida.
Eu estralo os dedos o tempo todo.
E sinto dores em todo o meu corpo.
Tenho pavor de telefones.
Escrevo poemas e poesias demais na esperança de que me salvem ou que me enxerguem ou que apenas tu me enxergue da forma que quero que me veja.
Até perco o meu pavor de telefones se for para ouvir tua voz do outro lado da linha me pedindo para te visitar.
Eu bebo demais.
Eu fumo vez ou outra.
E me sinto sozinho o tempo todo.
Tenho milhares de problemas.
Minha cabeça não é muito boa.
Meu coração é horrível e triste e solitário.
Tenho miopia das brabas.
Uso óculos e sempre as mesmas camisetas.
Te faço sorrir quando o que mais quero é chorar.
Te abraço quando sei que o teu dia está confuso.
E me isolo quando quero chorar e me sinto confuso.
Tomo antidepressivos.
Me sinto muito mal quando estou sozinho.
Ouço músicas o tempo todo.
Penso sempre no futuro.
E choro toda vez que lembro que me disseram que a gente ama apenas uma vez na vida.
Eu não sei amar, querida.
E escrevo muito, muito mesmo, até nada disso fazer sentido.
Até eu odiar todas as minhas palavras.
Chegar ao ponto de querer apagar todas elas.
E joga-las fora.
O que me faz lembrar que senti vontade de fazer isso agora.
Mas o estômago empapuçado de cerveja e besteiras comestíveis me fizeram um sinal para arrotar todas as minhas palavras na esperança contínua de que alguém se salve com alguma coisa escrita aqui.
Ou, que alguém me salve de todas as minhas loucuras.
Então, jogarei essas palavras clichês para toda a imensidão e para toda a eternidade.
E que todas essas pessoas acreditem que estou amando novamente.
De alguma forma.

- Meu bem. Meu bem. Como anda tua depressão e tua ansiedade?
- Dias difíceis, meu bem. Alguns dias fáceis. Andei fazendo terapia e me entupindo de remédios, acho que isso está funcionando.
- Tens se sentido sozinho, querido?
- Todos os dias, meu bem. Acho que estou me acostumando com isso.
- E o coração? Tens se sentido triste?
- Quando tento entrar no mundo e descobrir o que ele tem para me entregar, me sinto numa tristeza profunda.
- Mas, e o coração, meu bem?
- O mundo é foda, querida. Cada dia uma notícia pior que a outra. Cada notícia um fato que me afunda cada vez mais e me faz acreditar que eu faço parte dessas pessoas horríveis. 
- Te entendo. O mundo é deprimente. Mas, e o coração, meu bem?
- Eu sinto medo do mundo, querida. O tempo todo. Talvez, seja por isso que eu prefira me esconder em meu casulo por uns cinco, dez anos, e sair de lá quando eu acreditar que tudo está melhor.
- Mas, e o coração, querido?
- Mas o ser humano não deixaria eu me esconder por cinco, dez anos. Talvez, por cinco horas, no máximo. Ou, nem isso. Não sei bem o que pensar.
- Porque estas fugindo da minha pergunta, meu bem?
- Ah, claro, pois não?! Qual era mesmo a pergunta?
- Como anda o coração, meu bem?
- Démodé, querida. 
- O que quer dizer com isso, meu bem?
- Uma vez eu te falei que não sabia amar. Talvez, eu não saiba até hoje. Mas, andei reparando que as pessoas não sabem me amar. É muito difícil. E elas desistem. E eu já não fico tão para baixo com isso como ficava há uns meses atrás, acredito que eu prefira que as coisas sejam assim antes de todo fim prematuro que é destinado para nossos amores e romances. 
- O que tu sentes quando te falam sobre amor?
- Que é sempre um clichê romântico que todos sabem o final. Filmes previsíveis. Peça de teatro chata e monótona. A gente sempre sabe o fim disso.
- Tu falas como quem está mentindo, meu bem. E tu mentes tão mal. Estas amando alguém?
- Talvez eu esteja. Não sei mais.

...e não me importo.

Eu acho!
Romance é tão démodé, não é mesmo?
Acho que não estou mais preparado para isso.
E a gente segue mentindo que não sente nada.
Talvez, escrevi minha pior carta.
E não me importo com isso também.