Ela estava agachadinha
por trás da porta com cara de choro, mas um sorriso nos lábios e me disse: " -
Papai, olha, machucou meu joelho. Ralei e está doendo, mas consegui salvar
nosso cachorro! Ele ia ficar preso no portão.".
Ela estava
feliz por ter salvado nosso cachorro e eu estava preocupado com aquele joelho
todo ralado e com sangue em volta. E ela apenas sorria e me dizia “Eu o salvei.
Papai. Sou muito forte” e sorria e sorria e sorria. Achei engraçado porque ela
conteve o choro e estava feliz, feliz como eu nunca estive. Que lindo que era.
Cuidei de seu joelho. Coloquei um band-aid e deixei-a ir brincar de volta e
disse pra ela tomar cuidado dessa vez.
Eu estava
feliz. Minha filha. Minha filha. Minha pequena.
Pouco me
importava saber quem era a mãe. Não sei quem era a mãe. Eu estava feliz. Eu
corria atrás dela dizendo “Cuidado. Cuidado. Cuidado” e ela soltava seus risos
e gargalhadas. Alguém gritava ao fundo “DEIXA A MENINA BRINCAR. DEIXA”. E eu deixava.
Preocupado, mas deixava. Fazia calor e ela tinha que brincar. Ela merecia
brincar. Voa. Criança. Voa. Vai brincar. Imagina o teu mundo. Imagina que você é
a princesa e o nosso quintal é o terreno do teu castelo.
Brinque
muito, minha filha. Tenha essa sua infância maravilhosa.
Dei um
beijo em minha mulher e a visão que eu tinha dela estava embaçada, mas eu me lembro de sua voz
e acredito saber quem era a mãe. E eu estava feliz. Ela estava feliz. Minha
filha estava pulando no quintal, feliz. Feliz.
Eu tinha
que sair pra comprar a mistura para o jantar e abria o portão de nossa casa
ouvindo as gargalhadas dela ao longe. Era lindo. Eu estava feliz e saia
cantarolando uma música que ela tinha me ensinado a cantar. Eu estava feliz.
Acordei de
mais uma noite angustiante e percebi que tinha dormido um tanto quanto bem. Estava
com o peito vazio, mas tinha dormido bem. Percebi que tudo não passou de um
sonho. Sonho pelo qual eu estava feliz e nunca tinha sonhado com situações pelo
qual me encontrará feliz. Eu me senti completamente vazio por isso, mas foi
esse sonho que me levou a acreditar que um dia eu posso ser feliz. Será que eu
precisava de uma pequena criança pra me chamar de papai e mostrar o que é ter
felicidade? Ir pra casa e esperar ela correr para os meus braços e me contar
como foi seu dia? Casar. Ter uma família. Ter nossa casa. Saber o que é um
sorriso e uma gargalhada sincera. Abraçar minha mulher. Beijar minha filha e
lhe contar uma história antes de dormir.
Que linda
ela era.
Meu sonho. Esse
nunca foi o meu sonho da realidade e isso é o que me faz pensar em como a minha
mente se perpetua em completa confusão de sentimentos e pensamentos.
Eu não sou
uma pessoa feliz. Nunca fui feliz. NUNCA. Sou triste e solitário, mas vivo o
meu futuro hoje e sinto uma grande alegria dentro do peito ao acreditar que posso
salvar vidas com algumas de minhas palavras. Pelo menos até agora já deixei
melhor o dia de algumas pessoas porque elas leram algumas palavras minhas. Isso
é gratificante. Mas quem estará aqui pra fazer com que eu me sinta salvo? Ninguém
nunca mais me salvou e me tirou desse vazio diário que sinto. O que me deixa
mais triste.
Sonhei e me
senti um pouco mais feliz. Acordei e me senti um pouco mais confuso. Será que serei
salvo quando for um pai?
Filha. Espero-te
aqui pra me salvar desse vazio. Preciso ouvir o teu sorriso doce novamente e
dar aquele beijo doce em minha mulher.
VOA.
CRIANÇA. VOA!
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