quinta-feira, 30 de abril de 2020

Corona vírus me lembra que o medo de morrer sempre foi perda de tempo!

luna buschinelli (@LunaBuschinelli) | Twitter

- Estou te sentindo mais quieto esses dias, o que aconteceu?
- Nada, tudo sob controle. Só quero uma cerveja.
- Está tudo bem mesmo? Porque se não estiver, converse com mainha, ok?

Homem não chora, eles disseram.
Foda-se, eu estou chorando.
E não me importo com isso.
E saiba que escreverei todas essas palavras com lágrimas nos olhos.
Tudo bem a gente não se sentir bem. E tudo bem também a gente fraquejar.
Não tem problema a gente ser humano. Não tem problema a gente expressar sentimentos.
Ou, até mesmo, ficar em silêncio.
Não tem problema a gente surtar. E espernear. E morder o travesseiro. E chutar o travesseiro.
E socar as beiradas de nossas camas por vontade de querer nos socar por dentro.
Não tem problema o coração acelerar. O peito apertar. As mãos ficarem frias.
O estômago doer e fazer com que tudo que saia de dentro de você seja líquidos e mais líquidos de todas as bobeiras e pensamentos comestíveis que a gente consome. Que nos consome.
Não tem problema a gente sentir medo. A gente se sentir sozinho. A gente pensar na solidão. Não existe problema nenhum a gente sentir medo pelos nossos pais. Não tem problema nenhum a gente se sentir inseguro. Não tem problema nenhum a gente consumir álcool para conseguir nos entender melhor. Ou apenas um chá. Ou fumar alguma coisa. Quem sabe se masturbar. Quem sabe transar com alguém que esteja seguro suficiente para poder ir até você. Não tem problema nenhum a gente sentir imensa vontade de preencher o nosso peito com todas as coisas vazias que nos levam a acreditar que estamos inundados de tudo que existe de melhor nessa vida. Não. Não tem problema a gente achar que todos os meios que estamos seguindo são os certos ou, simplesmente, pensar que todos os meios que nos levam para algum lugar seja errado, mas que está tudo bem. Se eu cheguei até aqui, por todos os meus meios, não tem problema. Desde que não façamos mal a ninguém. E tudo bem acreditar nisso. Tu és tua própria sabedoria e fonte de formas ilimitadas para ser e viver algo melhor. A gente sabe disso. E não tem problema a gente errar de vez em quando. Ou muitas vezes. Ou todas as vezes. Não tem problema a gente ser humano, lembra?
E errar faz parte da gente.
E chorar faz parte da gente.
E ter medo faz parte da gente.
E toda essa gente não se importa com que a gente sente.
Porque eu deveria continuar escrevendo todas essas coisas quando, no fundo, ninguém se importa?
Pense bem, eu poderia escrever todos os meus erros e medos e anseios aqui e agora. Poderia te escrever coisas lindas e maravilhosas que fariam com que todas as minhas palavras tristes e melancólicas se transformassem em arte. Todos que se depararem com esta carta falariam que eu tenho um dom incrível de sair de uma tormenta e fazer um papel na sociedade que pouquíssimos são capazes de fazer. ARTE. Eu já fui exaltado nas ruas e nas esquinas e nas redes como um poeta incrível, e todos eles estão errados. Todos os que me chamaram de poeta e louvaram isso estão errados. E tudo bem a gente estar errado. Eu escrevo todas as minhas coisas achando que sou capaz de salvar alguém de um abismo sem fim, quando ninguém dá a mínima. E tudo bem eu acreditar que faço um bem maior para a sociedade. Quando, de fato, estou apenas desabafando sobre crises constantes de tristeza e ansiedade e depressão para pessoas que aparentam entender e sentir tudo que ouso sentir. E eu me sinto ligeiramente feliz quando essas pessoas se identificam. Mas eu não sou um poeta.
Não como eu gostaria de ser.
Não como eu gostaria de escrever.
Não como eu gostaria de ser visto.
Sou apenas um velho jovem que cospe cartas, sem ler, ao mundo. E tudo bem eu pensar que posso salvar alguém, algum dia, com todas essas palavras.
Mas o que me limita é saber que não sou capaz de salvar nem a mim mesmo, quanto mais outras pessoas. E que eu não tenho capacidade nenhuma para estender uma palma sequer para tirar alguém do fundo do abismo, quando é nele que estou toda vez que caio de frente com todas as minhas palavras.
Tudo bem a gente acreditar que sairemos dessa ilesos. Sem nenhum arranhão ou sem nenhum dano em nossas mentes já afetadas pelo tempo. A gente é humano. Pensamos demasiadamente em coisas boas e uma vida eterna e, claro, que seremos felizes, algum dia, mas a gente, como seres humanos, nos esquecemos que o abismo é onde passaremos nossa eternidade escura, sendo, um dia, felizes ou não.

- Será que eu já entreguei cartas boas?
- Tu sempre entrega cartas boas, meu bem.
- Não. Não é isso que eu quero dizer.
- O que queres dizer então, querido?
- Será que eu já entreguei palavras das quais as pessoas realmente se importaram? Será que eu escrevi coisas que as pessoas realmente se preocuparam e se perguntaram o porque de eu escrever cartas assim, invés de apenas se importarem com o que elas sentiram naquele momento?
- Eu acho que não, querido. Não desta forma.
- Porque eu deveria me preocupar com isso?
- Tu não se preocupas, meu bem. Tu sabes as pessoas que já preencheu o peito de alguma forma, só tens medo de que elas não tenham entendido tudo que queria dizer.
- Eu sempre peço ajuda nas minhas cartas e ninguém vem me salvar.
- Porque as pessoas não se importam, meu bem. As pessoas amam enxergar pessoas sofrendo e tudo de bom que elas fazem em cima disso, mas o que realmente bate dentro de você, ninguém se importa. E acho que, depois de anos escrevendo, tu deveria estar acostumado com isso.
- Não. Nunca me acostumo
- Tu irá morrer esperando coisas boas das pessoas, meu bem. Isso também é o que irá te matar.
- Preciso continuar escrevendo, querida. Se um dia eu esquentar o coração de alguém, talvez eu pare.
- Não é apenas esquentar corações que tu almeja, meu bem. Uma das coisas que mais tu lutas é que as pessoas te entendam, fiquem com o coração quente o suficiente para perguntarem, com sinceridade, se você está bem quando tu mais precisa de ajuda. Porque são nesses momentos que tu escreve.
- Eu preciso de uma cerveja, querida.

O álcool está me matando.
A falta de fumar minhas besteiras está me matando.
A raiva dentro de mim está me matando.
A expectativa em mim de criar algo bom está me matando.
E eu estou chorando.
Foda-se, eu estou chorando.
A tristeza está me matando.
Os pensamentos negativos estão me matando.
Não saber o que escrever está me matando.
No momento, as lágrimas estão me matando.
Cada gota que cai, o coração arde mais um pouco.
A ansiedade está me matando.
A depressão está me matando.
A ideia de encostar uma arma em minha cabeça me da forças para continuar.
E colocar o dedo no gatilho e ver que o medo de morrer sempre existiu.
E que isso sempre foi perda de tempo.
E pensar em inúmeros remédios passando pela minha garganta até chegar no estômago está me matando.
Seria mais fácil tomar veneno?
Seria mais fácil subir na sacada e pular?
E pensar em me matar está me matando.
Não pelo fato de partir, mas pelo fato de lembrar que morrer sempre foi muito fácil.
Viver que é difícil. Difícil para um caralho. E a gente se esquece disso. Talvez seja bom a gente passar por crises e perceber que a gente tem muita coisa lá fora para aproveitar e viver e ter e sonhar e sentir e amar.
Esqueci de falar sobre o amor nessa carta. Que milagre, não é mesmo?
A falta de amor está me matando.
Amar alguém está me matando.
E querer alguém está me matando.
E sonhar com um possível amor no futuro está me matando.
E a falta de romantismo está me matando.
E a forma com que a gente finge não se importar com romances está me matando.
E minha mãe orando pedindo a Deus um mundo melhor está me matando.
E meu pai se fazendo de forte está me matando.
E a minha visão míope sem conseguir enxergar um futuro próximo está me matando.
E ter meus amigos longe demais está me matando.
Viu só como eu consigo mudar rapidamente de assunto quando se trata de amor?
Não porque eu quero. Não porque eu não me importo. Não porque eu não esteja amando. E não porque eu não me importe com outro alguém que passa pelos meus sonhos todas as noites, mas sim por eu não querer fazer parte de um romance num mundo doentio em que todas as pessoas estão doentes. Não por um vírus, e sim doentes pela falta de amor. Porque todas as pessoas esqueceram como que faz para amar. E as que sabem ou acham que sabem, como eu, fingem não se importar em amar o próximo. Deixa a gente seguir esse erro e adoecer cada vez mais. Porque é muito lindo tu fingir não se importar com o que bate em teu coração. E é muito lindo tu fingir que os poemas e músicas e livros e filmes não se parecem exatamente com o que está batendo dentro de ti. E deixa as lembranças boas de um futuro que poderia existir irem embora de uma vez por todas. Porque o amor não vale a pena. E a gente não é mais capaz de amar. O jogo do amor se tornou um grande monumento de ego e orgulho para ver quem finge se importar mais.
O lado bom é que eu perdi esse jogo faz tempo.
Então, apenas deixa o meu amor aqui dentro bater um pouquinho mais.
Enquanto todas as pessoas fingem que não amam.
Meu coração sempre vai bater por alguém. E por esse alguém, eu sempre irei escrever poemas, mas eu não quero fazer parte de um jogo. Quero fazer parte do que é real, antes mesmo de alguma crise de ansiedade forte bater em mim e fazer com que eu desista de vez.
Pelo menos, fecharei os olhos uma última vez e saberei que tudo que vivi foi de verdade.
Mentiras não me surpreendem mais.

Então, meu amor, vamos gozar antes que o mundo acabe.
Vamos viver antes que o mundo se parte.
Vamos ler todos os livros que pudermos.
E assistir todos os filmes que forem possíveis.
Vamos lembrar de todos os amigos antes que o mundo acabe.
Vamos assistir todas as séries cabíveis.
E beber todo álcool que a gente for capaz de consumir.
Vamos fumar tudo que estiver ao nosso alcance.
Vamos ouvir todas as músicas antes que o mundo acabe.
E que, quando acabar, esteja tocando a nossa canção preferida.
Vamos praticar todos os exercícios que pudermos.
Vamos trabalhar muito, mas muito mesmo, antes que o mundo acabe.
Vamos fingir ser produtivos.
Escrever todas aquelas coisas produtivas para nossos chefes que não se importam com a gente.
Vamos publicar relatórios incríveis para fazer nós mesmos acreditar que estamos produzindo em massa e fazendo um bem para a humanidade.
Porque ela realmente se importa com tudo que você produz.
E a humanidade se importa com todas as coisas que tu tens feito para sair dessa numa melhor.
Vamos fazer yoga antes que o mundo acabe.
Vamos publicar todas as nossas fotos nas redes sociais antes que tudo desabe.
Vamos assistir todos os vídeos ao vivo possíveis antes que aqueles famosos morram por algum motivo.
E vamos publicar algo construtivo na internet para fazer as pessoas pensarem que você é incrivelmente foda nessa quarentena, quando na verdade, tu deveria e poderia estar apenas pintando suas unhas, dando um abraço no cachorro, jogando alguma coisa. Qualquer coisa simples assim.
Vamos apreciar as folhas caindo das árvores e os pássaros cantando na janela, talvez seja a última vez.
Vamos fazer todas essas coisas antes que tudo acabe.
Antes que o mundo acabe, vamos ser fúteis. Vamos comprar milhares de cuecas e calcinhas e celulares e comidas caras e roupas caras por algum aplicativo. Vamos gastar o que não temos. O mundo está acabando mesmo. Foda-se!
Vamos ser egoístas. Vamos ser clichês. Vamos ser irresponsáveis. Vamos xingar o presidente, isso sim! Sempre.
E vamos ser irônicos, claro.
Vamos convidar alguns amigos para virem em casa e fazer uma pequena festa, vamos mostrar para o mundo que somos corajosos e incentivar outras pessoas a fazerem isso também.
Vamos nos importar com o namoro de algum famoso e fazer piadas e mais piadas em cima disso.
Até porque é muito divertido rir da ideia de alguém estar se fodendo com o amor. Nós somos seres humanos extremamente evoluídos quando o assunto é amar. E isso faz todo sentido.
Vamos acreditar que o fim está próximo e nos esquecermos de nos transformar em pessoas melhores.
E vamos nos esquecer de mandar mensagens sinceras sobre como estão nosso amigos e familiares.
Vamos ser mesquinhos e fingir que a gente não se importa com nenhum deles.
Foda-se. O mundo está acabando. Tudo está se partindo. Tudo vai desmoronar a qualquer momento.

E foda-se se eu estou chorando.
Eu escrevi todas essas palavras e nem eu mesmo sei ao certo o que querem dizer.
E tudo bem eu me sentir assim.
Ontem a tarde, eu estava morrendo de medo da morte.
De madrugada, eu estava desejando a morte.
Hoje, eu acordei com o pensamento de que pensar na morte é uma perda de tempo quando você não mandou "Tudo bem com você?" para ninguém que tu diz se importar.
Nem para os amigos.
Nem para teus pais.
Nem para teu romance.
E existe um pássaro amarelo depressivo dentro do meu peito que não me deixa voar em liberdade para ser capaz de fazer essa pergunta sincera para todos que eu gostaria. E ficar bem com as respostas ou tentar ajudar caso seja uma resposta triste.
Esse pássaro não quer voar.
Então, deixa ele aqui dentro quietinho.
Madrugada passada, a morte encostou em meu ouvido e disse "Eu te amo".
Eu não acordei bem, e tudo bem a gente não se sentir bem, mas uma pergunta ou uma frase pode mudar tudo. Toda a trajetória de um futuro pode ser mudada e revelada através de uma pergunta surpresa e sincera, mas a gente nunca sabe de onde irão vir essas perguntas. A gente nunca sabe quem realmente se importa. Então, eu me disponho a ficar quietinho comigo mesmo e meu pássaro amarelo, enquanto as pessoas se deparam com mais uma "arte" minha através da melancolia.
E mesmo que eu tenha pensado na morte ou em suicídio e feito minha depressão e ansiedade falarem mais alto do que eu, espero que essa minha carta faça alguém ter uma mudança incrível de trajetória de pensamentos e sentimentos quando eu mais estou indisponível para te fazer mudar e acreditar que és capaz de sair desse fim de mundo.
Espero que eu tenha aquecido o teu coração.
E que tudo esteja bem.
Isso é tudo que tenho para te entregar quando não vejo mais saída de todas as coisas e quando penso que o mundo não se importa.

Isso é tudo que eu tenho a dizer, por ora.


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