quinta-feira, 16 de janeiro de 2020

A psicóloga não me aceitou por eu ter sérios poemas mentais!

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Veja bem
meu bem
Te escrevo para te dizer que estou muito bem
Bem. Bem.
Muito bem.
Em meio ao bem.
Mais ou menos bem.
No meio termo complexo de estar bem,
eu estaria bem se não fosse por você.
Meu bem.
E diz-se "meu bem" na tentativa frustrada de te chama-la de "meu bem"
Sendo que tu não me fazes tão bem
Quanto deveria
Ou quanto eu acharia
Meu bem
E eu tento acreditar que tu és o meu bem, meu bem.
Mas não é.
Não mais.
E então, não estou tão bem, bem, bem.
Não.
E o estômago esburacado de comida empapuçada me deixa estranho
E eu deveria te ligar, meu bem.
Deveria pegar o meu celular e discar o teu número
E enquanto o teu toca do outro lado da linha
Eu tremer sem reticências
E com muito sentimento
Te pedir para me ouvir um pouco
Só um pouco
um pouquinho mais.
Uma última vez.
Talvez.

- E o que queres me dizer, meu bem?

Meu bem.
Veja bem!
Eu tenho ouvido todas as músicas que você odeia.
E lido todos os livros que você também odeia.
Tenho enxergado todos os caminhos pelos quais você não tenha passado.
Mas pelo fato de eu saber todos os caminhos em nosso carro que você costumava mudar a direção.
Tenho me alimentado de todas as comidas que você jamais comeria.
E entrado em todos os restaurantes que você não passava perto.
Tenho experimentado gostos diferentes. Gostos que eu sei que tu jamais experimentaria.
Tenho ido em bares que você detestava.
E tragado cigarros que você criticava.
Tenho também bebido todas as cervejas mais amargas sabendo que tu jamais as colocaria na boca.
Tu detestava coisas amargas.
Assim como eu aos domingos a noite.
Velho. Ranzinza. Amargo.
Mas que te amava e te pedia para não ir embora.
Amargo. Velho. Ranzinza. E chato.
Mas esse que te pedia para ficar.
Tenho assistido todos os filmes de terror que você costumava me chutar de leve pedindo para tirar.
Tu tinhas medo. Muito medo. E eu sorria.
Colocava numa comédia romântica que eu sempre detestei só para não te ver amarga.
Tenho escrito poemas secretos porque eu sabia que você odiava meus segredos reprimidos.
E todos os meus segredos eu deixei para me fazer de poema.
Escrevi todas as minhas fraquezas porque eu sei que você odiava quando eu caia e me sentia fraco.
Me revesti completamente de poesias e aromas e cores e saídas para saber que tenho me amado um pouquinho mais.
E que tenho me cuidado um pouquinho mais.
Sabendo que eu precisava me cuidar, me cuidei mais ainda porque eu sabia que você odiava quando eu tinha todas as minhas paranoias noturnas acreditando que nada estava bem.
E nada está bem.
Nós não estamos bem.
O mundo não está bem.
As pessoas não estão bem.
E eu sei que nada vai bem, meu bem.
E espero que um dia estejamos bem, querida.
Mas nada disso importa quando a gente não sabe mais amar.
Quero dizer, nada mais importa quando a gente perde o caminho para amar.
E amar é algo complexo.
E eu amo situações complexas, mas você odiava.
Tenho passado a ama-las mais ainda por lembrar que você odeia complexidades.
Ah, meu bem, tenho teorizado muito mais sobre universos, seres, mares, oceanos e planetas. Tu odiavas quando eu fazia isso, não é mesmo?
Esses dias eu comprei aquele perfume que tu odiava.
E eu amei passar aquele perfume em mim.
E eu amei sentir aquele cheiro em mim.
E sair nas ruas de São Paulo com aquele cheiro.
E eu amei mais ainda pessoas elogiarem o meu aroma e sorrirem falando que eu estava bem.
Muito bem, meu bem.
Por fora.
Pelo cheiro.
Pela comida.
Pelo aroma.
Pelo prazer.
Pela música.
Pela bebida.
Pelo cigarro.
Pelo filme.
Por ti. Por mim. Por nós.
E eu estou bem. Não tão bem quanto deveria. Não tão bem quanto gostaria.
Existe alguma comida estragada que eu comi e tinha passado da validade.
Acho que esse alimento tem algo relacionado com o teu nome. Ou o teu jeito. Ou o teu amor. Ou o teu desprezo.
Acredito que seja algo relacionado ao teu descaso.
Porque eu odeio tudo que você ama.
E amo tudo que você odeia.
E te amo por me odiar da forma que tens feito.
E isso, de alguma forma, me deixa um pouco mais forte.
De alguma forma.
Preciso me examinar. E enxergar o resultado de uma intoxicação alimentar que passa diariamente pelo meu estômago, sem remédio para cura.
Nós somos, incrivelmente, odiosos aos olhos um do outro.
Tu não me enxerga como um dia te enxerguei.
E eu odeio te enxergar da forma que enxergo.
Essa visão míope e cansada mostra de ti muito mais do que eu gostaria de enxergar.
E sentir.
E escrever.
Acho que eu perdi a noção do raciocínio quando o estômago empapuçado começou a desgostar da forma em que tenho te escrito.
Que estranho, você não acha?
Essa minha forma de falar sobre o amor tem deixado todo mundo de queixo caído.
INCLUSIVE A MIM MESMO.
Sabe o que é divertido, meu bem, meu bem?!
A gente nunca se importa com as artes que nós mesmos fazemos.

- Tu tens se sentido bem?
- Nada bem, doutora.
- Tens estado bem?
- Algo bem, doutora. Não sei.
- Tens comido bem?
- Variadamente bem, doutora.
- Tens bebido?
- Quase nada bem, doutora.
- E fumado?
- Pouco bem, doutora.
- Tens dormido bem?
- Muito pouco bem, doutora.
- Tens se apaixonado?
- Perdidamente bem, doutora.
- Tu tens estado bem, pelo jeito. Tudo bem então?
- Nada bem, doutora. Nada bem!
- E o coração?
- Tristemente bem, doutora.
- E a mente?
- Insuportavelmente tristemente bem, doutora.
- Te entendo. Anotado. Até semana que vem.

Loucura!
Qual era a palavra?
Loucura?
Loucura. Esqueci. Qual era a palavra?
Qual palavra era?
Perdida.
Sumida.
Falida.
Loucora. Lucora. Locora.
Loucura?
Cacete.
Qual era a palavra?
Mente?
Mente que mente e atormente loucura.
Algo com loucura.
Que me deixava para baixo. E louco.
Loucura, não é mesmo?! Tristeza?
Não lembro. Isso é estranho.
E eu tenho andando muito estranho.
Ah, pois bem. E te escrevi!!!

Tu notaste que eu tenho mudado minha forma de escrever?
Não estou ligando para a complexidade de todos os pontos finais!

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